10 fevereiro 2010

O SENTIDO DE UMA COLETÂNEA

(Apresentação do livro Escritos 2, organizado por Benedito Saldanha)

Há quase seis mil anos, entre os rios Tigre e Eufrates, eram publicados em tabuinhas de barro os primeiros registros literários da humanidade, os poemas sumérios. Um longo caminho de pedras e peles, que não prescindiu da memória oral, nos trouxe às condições atuais. Facilidades gráficas e veiculação eletrônica abriram nova perspectiva. Mais democrática, porque agora quase todo o autor tem a alegria e a aflição de expor o seu trabalho à crítica dos leitores e do tempo.

Algum saudosista talvez prefira as dificuldades anteriores, por considerá-las mais seletivas quanto à qualidade. Mas reflitamos: quantas limitações diversas do critério qualitativo se interpunham, e ainda se interpõem, à edição de obras? O mercado mundial não é dominado por meia dúzia de monopólios, detentores de uns poucos best-sellers de escasso ou nenhum valor, empurrados via marketing e listas de mais vendidos, contra a variedade e o apuro da produção literária efetiva? A qualidade, ensinam a prática e a filosofia, está intimamente ligada à quantidade: quanto mais se lê e se escreve, maiores as perspectivas de o trabalho atingir um grau de excelência. Quanto mais escritores forem editados com critério, maior a possibilidade de surgir entre eles algum que capte em alto nível as vicissitudes de nossa época. O que não significa dizer, claro está, que cada um deveria publicar o máximo, porém o melhor. E eis aí, também, o sentido histórico de uma coletânea.

Escrever, depois de algum aprendizado, atingirá sempre a alguém, o outro. Se nem a todos está reservada a permanência no tempo, a obra bem construída tem o que oferecer a um círculo sempre crescente de leitores na medida do seu valor literário - ou seja, aquilo que é capaz de causar prazer estético.

Transformar a experiência vivida e imaginada em poemas, contos e crônicas é tornar o mundo mais nosso – e, portanto, mais humano. A leitura, da mesma forma, nos torna mais donos de nós mesmos, impede que sejamos engolidos pelas coisas, aproxima-nos do real através da palavra. Onde mais poderíamos encontrar o inesperado e resgatar o perdido, superar as dificuldades via humor ou revivência? O poeta Ferreira Gullar sugeriu que se escreve porque falta alegria, e quando há alegria se quer mais alegria, o que também implica um desejo de sociedade mais justa e humanitária.

Nessa coletânea, dezoito escritores, entre novos e tarimbados, oferecem o seu melhor.

Sidnei Schneider, 2009

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