11 dezembro 2011

O ENREDO É IMPORTANTE? por Luis Bras*

O enredo voltou ao debate. O pobre e desvalorizado enredo.

As categorias da ficção são basicamente cinco: linguagem (considerando também o foco narrativo), personagem (o protagonista ou o narrador-protagonista ou os muitos personagens centrais, se houver mais de um), enredo, espaço e tempo.

Para muitos escritores e críticos as duas primeiras categorias — linguagem e personagem — são as mais importantes, sendo a menos importante o enredo. Quando a gente pensa em romances como Em busca do tempo perdido (de 1913 a 1927, Marcel Proust), Ulisses (1922, James Joyce), Senhora Dalloway (1925, Virginia Woolf), Berlin Alexanderplatz (1929, Alfred Döblin), Enquanto agonizo (1930, William Faulkner) e Catatau (1975, Paulo Leminski), a gente está pensando em romances de personagens e linguagem complexos, porém de enredo simples.

O oposto disso, o ponto extremo, são os romances de enredo complexo e personagens e linguagem simples. Nesse ponto extremo costumam ser colocados romances como O conde de Monte Cristo (1844, Alexandre Dumas), O senhor dos anéis (1954, J. R. R. Tolkien), Solaris (1961, Stanislaw Lem), Stalker (1971, Boris e Arkady Strugatsky), Lanark (1981, Alasdair Gray), A guerra dos tronos (1996, George R. R. Martin). A crítica especializada costuma rotular pejorativamente esses livros. Eles são classificados como literatura de entretenimento.

O enredo parece ser o inimigo público número um dos escritores que desejam ingressar no seleto time da alta literatura, da literatura sofisticada. No equilíbrio das categorias ficcionais, ele jamais pode sobressair, ele jamais pode suplantar o personagem e a linguagem, se o ficcionista deseja realmente produzir uma obra de arte. Essa é uma certeza da maioria dos autores e da crítica contemporâneos.

Mas a supervalorização da linguagem e a desvalorização do enredo é uma proposta modernista. Essa proposta tem a ver com o antigo sistema de crenças chamado esteticismo, ou arte pela arte. Hoje essa proposta virou uma armadilha.

Isso não significa que o seu oposto, a supervalorização do enredo, é o mais desejável. Essa é outra armadilha, análoga à primeira.

Pra mim, como autor e principalmente leitor, os extremos são pouco atraentes. Eu tenho procurado o meio termo: uma linguagem interessante a serviço de um enredo interessante. Hoje, no romance e no conto, eu não abro mão de uma boa trama conduzida, é claro, por uma linguagem consistente. Nessa larga região fronteiriça eu costumo colocar romances como Grande sertão: veredas (1956, Guimarães Rosa), Cem anos de solidão (1967, Gabriel García Márquez) e Neuromancer (1984, William Gibson).

* Parte 1 de TRÊS PROVOCAÇÕES PARA EXCITAR O FOGO: O enredo é importante? Há falta ou excesso de bons livros? Quais mundos estão à espera dos escritores? - Jornal Rascunho, Curitiba, Nov. 2011, p 16. Luiz Bras é pseudônimo do escritor Nelson de Oliveira.

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